30 março, 2007

O Caimão



Bruno Bonomo é um cineasta falido, cujo último filme “Cataratas” -título que é no fundo, a metáfora a sua própria queda- foi um fracasso; vê, de repente, cair-lhe no colo, o guião de um filme intitulado “O Caimão”, de autoria de uma jovem realizadora.
Sem qualquer hesitação assume o projecto e só quando começam a surgir as primeiras contrariedades e recusas, se apercebe que a história é, sobretudo, uma referência ao berlusconianismo; na qual o grande magnate é apresentado de forma folclórica como um ser fanfarrão, que desce dos céus de helicóptero no meio de estádios, agradecendo ridiculamente os aplausos de um público, para o qual criou programas de televisão popularistas. Um personagem eminente que, num monólogo notável (interpretado pelo próprio Moretti), não se coíbe de afirmar com arrogância que se serviu dos fascistas e dos separatistas da Padania para, com eles, alcançar o governo.
Paralelamente, o guião estabelece pontes entre a realidade politica italiana e a própria vida familiar do protagonista, que entrou em ruptura, na qual são evidentes as dificuldades e ilusões, enfrentadas pelo núcleo constituído por Bonomo, sua mulher e dois filhos.
São de sublinhar as cenas de ciúmes grotescas e aquele instante sublime e marcante, quando o pai pergunta: “Até quando posso fazer cócegas aos meus filhos?” E obtém como resposta: “Até aos 10!”. Numa clara sugestão aos limites temporais que enformam, seja ela qual for, a situação vivenciada.
A estreia de “O Caimão” precedeu as eleições para o Parlamento italiano e Berlusconi foi derrotado.
Filme profético? Pouco importa. Acima de tudo deve ser considerado como uma denúncia aberta, corajosa e sem tergiversações, da pusilanimidade de alguns perante o culto da mistificação permanente,  de quem não tem escrúpulos e utiliza o vale tudo, para se manter no poder.
Depois de nos ter tocado com esse notável filme que foi “ O Quarto do filho”, Nanni Moretti regressa de novo à intervenção política, afirmando-se mais uma vez como um dos maiores autores do cinema contemporâneo.
Foto: Web

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