O Klippekort, a máquina de obliterar, o condutor que salivava e não era máquina, o descendente de Cossacos e o DON.

Era o terceiro autocarro que passava e já estávamos na paragem há uns bons seis ou sete minutos, à molhada como é uso e costume nas paragens destas paragens.
Finalmente lá conseguimos entrar, nós que, aparentemente, éramos os únicos impacientes. Mas, azar luso: A máquina de obliterar recusou o klippekort ou, se calhar, foi este que não quis ser obliterado. Há klippekorts assim...
Em face da dificuldade solicitei ajuda ao condutor, que me disse para insistir com mais firmeza. Não resultou.
Atrás de nós ninguém se manifestava.
Repeti o pedido sugerindo que fosse ele a cortar o módulo, mas o zeloso motorista, molhou o dito com saliva apertou-o bem e mandou-me repetir a operação, dizendo que que não era uma máquina, era uma pessoa.
Perante um novo fracasso, retorqui-lhe que também eu era uma pessoa e estrangeira, pouco habituada a situações como aquela.
Com indiferença glaciar rematou que tinhamos que pagar novos bilhetes.
Na rua as pessoas continuavam calmamente à espera ou optavam por outro autocarro que entretanto tinha chegado.
Quando, já visivelmente irritado e depois de nova tentativa, lhe ia replicar que tinha um título de transporte previamente pago e não entendia porque não era validado, eis que, vindos por cima de várias cabeças, surgem dois bilhetes, enquanto alguém dizia com ar sorridente: Eu ofereço-vos os bilhetes, podem entrar!
Era um Russo, quem sabe se descendente dos cossacos, com um ar tão pacífico como o do Don, um cachorro Pastor alemão, de quatro meses e olhar meigo que o acompanhava e que parecia assustado no meio de tantos humanos -uns mais do que outros.
Escusado será dizer que passei a curto trajecto, a tentar ressarcir o nosso simpático auxiliante, da despesa efectuada, mas ele recusou sempre com um largo sorriso.
Apenas lhe pudemos retribuir a amabilidade, com as festas e elogios que fizemos ao Don e que por momentos nos remeteram para a nostalgia de outras "viagens", com outros "cãopanheiros" sempre presentes na nossa memória afectiva.

Apostila: O método de validação de títulos de transporte em Copenhaga vai ser alterado, porque é de facto a única falha que existe num sistema cuja eficácia é notável.

Imagem: Web